O aumento no número de novos casos de Transtorno do Espectro Autista (TEA) é uma realidade cada vez mais evidente em todo o mundo. E da mesma forma, mas provavelmente por motivos distintos, também se tem observado um aumento consistente no nascimento de crianças com Síndrome de Down (SD).
Até alguns anos atrás, se uma criança era diagnosticada com SD, habitualmente nós considerávamos que todas as suas manifestações clínicas (fossem elas físicas, intelectuais ou comportamentais ) poderiam ser explicadas pela alteração genética existente, ou seja, pela trissomia do cromossomo 21. Contudo, isso não parece ser totalmente verdade, pois hoje sabemos que uma parcela considerável das crianças com SD também pode estar dentro do espectro do autismo.
Este assunto ganha uma enorme relevância nos dias atuais, já que as modalidades de tratamento e reabilitação utilizadas para estas duas condições podem ser bastante diferentes. Não tratar as manifestações comportamentais típicas do TEA em uma criança com SD pode ser desastroso e comprometer significativamente seu futuro.
É importante reconhecermos que há alguns sinais e sintomas que podem estar presentes em ambas as condições (SD e TEA), o que pode dificultar a avaliação clínica destas crianças. Contudo, isso não deve e não pode retardar o início do tratamento, já que hoje sabemos que os melhores resultados nas crianças autistas estão intimamente relacionados ao início precoce das terapias de reabilitação e a escolha correta das modalidades terapêuticas.
Sabidamente, embora hajam relatos de crianças com intelectualidade dentro da normalidade, a maior parte dos indivíduos com SD apresentará algum nível de Transtorno do Desenvolvimento Intelectual. Por outro lado, a exata incidência de comprometimento intelectual em crianças autistas ainda não é precisamente conhecida, principalmente no Brasil.
Nesse ponto, devemos ressaltar que a maioria das crianças com SD não apresenta qualquer comprometimento de suas habilidades de relacionamento social, embora um pseudo-isolamento possa ser provocado pelo atraso do desenvolvimento da linguagem falada ou por mecanismos de inclusão ineficientes. Já as crianças com TEA têm como base de seu diagnóstico clínico justamente o comprometimento de suas habilidades sociais em graus variados, o que provoca, como regra geral, uma tendência ao isolamento por falta de domínio de diversas normas sociais.
Desse modo, algumas dicas são importantes para que pais de crianças e adolescentes com SD possam suspeitar que seu filho possa estar dentro do espectro do autismo.
Via de regra, crianças com SD (embora apresentem desenvolvimento neuropsicomotor mais lento) têm aquisições de novas habilidades neurológicas sempre de forma contínua e progressiva. Ou seja, embora demorem um pouco mais para iniciar os primeiros passos, uma vez que esta habilidade é adquirida, ela não regride.
A mesma coisa ocorre com a fala. Uma vez que as primeiras palavras começam a surgir, a linguagem falada se desenvolve de forma cada vez mais consistente. E com o comportamento social não é diferente, ou seja, crianças com SD que apresentam uma boa interação social não perderão essa característica com o passar dos anos.
Assim, se seu filho com SD não apresenta um desenvolvimento verbal e social consistente, ou se ele tem regressão de habilidades previamente adquiridas, você precisa estar muito atento pois pode se tratar de uma comorbidade (de uma associação) com TEA.
Uma outra dica muito importante e que pode ajudar bastante no diagnóstico: filme e documente o comportamento diário de seu filho! Faça isso em casa e peça para que a professora faça o mesmo na escola enquanto a criança interage com os colegas.
Caso surja alguma suspeita de que a criança esteja dentro do TEA, é fundamental que durante a consulta com seu médico ou com o psicólogo você tenha vídeos para demonstrar o comportamento em diversos ambientes: na escola, em casa, em aniversários, com a família e com outras crianças.
Isso é importante porque é extremamente difícil para os pais descreverem de forma clara e objetiva o comportamento social de seus filhos, uma vez que muitos imaginam que se as crianças estão brincando todas em um mesmo ambiente, elas estão se relacionando socialmente… mas isso não é verdade.
O fato de um grupo de crianças estar “aparentemente” brincando juntas, em um mesmo ambiente, não significa necessariamente que elas estejam interagindo socialmente de forma efetiva. Desse modo, somente um profissional com experiência em análise de comportamento será capaz de distinguir essas minúcias do comportamento infantil diferenciando o que é típico do que é atípico.
Um outro aspecto importante e que pode trazer dúvidas: crianças menores são altamente inclusivas e, infelizmente, algumas perdem parte desta característica com o passar dos anos. Podemos observar isso de modo bem claro nas escolas, pois as crianças com SD são facilmente incluídas nos primeiros anos do ensino fundamental.
Contudo, após alguns anos, é comum um certo distanciamento das demais crianças e adolescentes, o que pode gerar um falso isolamento do indivíduo com SD. Evidentemente, isso não deve levantar a suspeita de TEA, já que ocorre em crianças mais velhas e geralmente é restrito ao ambiente escolar.
Enfim, agora que sabemos que há uma interposição grande entre TEA e SD, podemos estar mais atentos para que o diagnóstico – e, consequentemente, o tratamento – seja iniciado o mais precocemente possível.
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