Bom, esta é uma pergunta ouvida praticamente todos os dias nos consultórios médicos de pediatras, neuropediatras e psiquiatras infantis. Infelizmente, a resposta não é simples, pois ainda existem muitas dúvidas a respeito de quando iniciar um tratamento com medicamentos e até mesmo sobre qual o melhor fármaco para cada criança.
De uma forma geral, devemos compreender que NÃO existe nenhuma medicação que seja capaz de reverter ou amenizar os sinais e sintomas que são PRÓPRIOS do transtorno do espectro autista (TEA). Ou seja, não existe uma medicação que melhore diretamente o comportamento social e nem que acelere o desenvolvimento da linguagem falada, pois estas são características INATAS do cérebro da criança autista. Seria como tentarmos utilizar uma medicação para alterar a cor da pele, dos olhos ou dos cabelos de uma pessoa… isso não irá acontecer.
Existe uma enorme carga de pesquisas científicas demonstrando que o tratamento do transtorno do espectro autista (TEA) deve ser baseado em terapias de reabilitação com a utilização de técnicas moduladoras de comportamento. Quanto a isso, a ciência ainda não divergiu.
Então, quando devemos pensar em iniciar tratamento medicamentoso para essas crianças?
Quando há sintomas comportamentais que não puderam ser minimizados ou controlados satisfatoriamente por terapias comportamentais, e que seguem trazendo comprometimento significativo à qualidade de vida da criança e das pessoas próximas, como os familiares e colegas da escola. Nestes casos, podemos pensar em escolher um medicamento que trate especificamente aquele sintoma.
É muito importante lembrarmos que muitos dos medicamentos utilizados na neurologia e na psiquiatria podem apresentar efeitos colaterais complicados como, por exemplo, a sonolência. Isso é muito ruim, pois como estamos falando de crianças que muitas vezes apresentam atrasos de desenvolvimento, qualquer nível de sedação pode retardar ainda mais a aquisição de novas habilidades. Por este motivo, quando optamos por iniciar medicação para indivíduos com TEA, devemos ficar atentos ao surgimento de efeitos colaterais, os quais podem justificar a interrupção imediata do tratamento.
De um modo geral, os medicamentos mais prescritos são os antipsicóticos, antidepressivos, ansiolíticos, estimulantes e estabilizadores de humor. Os antipsicóticos podem ajudar em casos de agressividade, autoflagelação e agitação psicomotora mais intensa. Os antidepressivos podem ser indicados para ansiedade, depressão, fobias e insônia. Já os ansiolíticos podem reduzir sintomas de ansiedade e distúrbios do sono, enquanto os estabilizadores de humor podem reduzir a agitação e a irritabilidade. Em casos bastante específicos, a indicação de estimulantes pode melhorar a atenção e concentração, potencializando o rendimento escolar e pedagógico.
Por se tratarem de medicações bastante específicas, as doses devem ser individualizadas e orientadas por um médico especialista na área.
Certamente, a medicação mais utilizada em crianças com TEA no Brasil é a Risperidona, um antipsicótico atípico que já demonstrou sua eficácia na redução de comportamentos hipercinéticos, agressivos e na insônia. Em parte dos pacientes, parece haver melhora dos níveis de concentração, também. Embora os estudos iniciais que testaram a eficácia da Risperidona em indivíduos autistas já tenham mais de 15 anos, nós ainda não conhecemos exatamente todos os mecanismos de ação deste fármaco. Sabemos que ele age em diversos circuitos cerebrais relacionados ao comportamento humano ligando-se à receptores de serotonina e de dopamina D2, sendo eficaz em uma parte considerável das crianças com TEA. Embora seja uma medicação considerada bastante segura para as crianças, periodicamente são necessários alguns exames de rotina para acompanhamento do tratamento.
Outra medicação também aprovada para o uso em indivíduos com TEA é o Aripiprazol. Infelizmente, em nosso meio, seu elevado custo reduz muito a possibilidade de prescrição para muitas pessoas. Não se conhece exatamente como o Aripiprazol age no córtex cerebral, mas estudos comprovam sua eficácia na redução da agressividade, hiperatividade, irritabilidade e impulsividade em crianças autistas. Há relatos de considerável diminuição de estereotipias motoras em crianças autistas após uso desta medicação.
Embora o Aripiprazol seja considerado seguro, efeitos colaterais como sensação de cansaço, fadiga crônica, ganho de peso, salivação e tremores são frequentemente relatados por estes pacientes.
Por outro lado, o uso de psicoestimulantes para crianças com TEA é um assunto ainda um tanto quanto incerto na literatura. Sabidamente, parte das crianças com TEA apresenta melhora de seus níveis de atenção e concentração com uso desta classe de medicamentos. Os psicoestimulantes agem principalmente inibindo a recaptação da dopamina e da noradrenalina e, consequentemente, aumentando os níveis de catecolaminas nas terminações nervosas. Desse modo, parte das crianças autistas tratadas com psicoestimulantes experimenta uma significativa melhora em seus níveis atencionais, com redução da hiperatividade e melhora da performance escolar.
Por fim, embora haja uma infinidade de medicamentos que possam ser indicados conforme o sintoma que se deseja abordar, é FUNDAMENTAL lembrarmos que o tratamento do TEA deve estar embasado em um programa de reabilitação bem montado e conduzido por pessoas tecnicamente capazes. A alternativa medicamentosa SEMPRE SERÁ A ÚLTIMA opção.
Dr. Paulo Liberalesso
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