Alguns comportamentos de crianças autistas são muito desafiadores para os pais, sobretudo por não compreenderem a razão do comportamento do filho. A primeira coisa que precisamos fazer quando estivermos diante de um comportamento cuja razão desconhecemos é nos perguntar: “porque ele está agindo assim?”.
Todo comportamento humano tem uma razão de existir, não há comportamentos aleatórios; com o autista não é diferente. A diferença é que a percepção e a expressão do autista difere em relação a pessoas neurotípicas. Essa divergência gera reações distintas a estímulos externos. A compreensão dessa particularidade é a principal chave para a resolução do problema.
Quando um bebê chora, o choro revela um incômodo. Ele chora como comportamento reflexo, expressando fome, sede, frio ou dor. Quando o bebê vai se desenvolvendo e adquirindo acesso ao mundo simbólico compartilhado por pessoas de uma mesma cultura, a expressão das necessidades fisiológicas básicas vai dando lugar à expressão dos desejos, que vai sendo feita por meio de uma comunicação aprendida socialmente: sorriso e olhar compartilhado. No processo de desenvolvimento, vão aparecendo formas mais complexas de expressão, como gestos, mímica facial e linguagem. Todo esse complexo processo de aprender a comunicar desejos, incômodos e necessidades se dá através da relação estabelecida entre a criança e as pessoas próximas que cuidam dela.
O bebê autista tem um aprendizado social distinto, porque a sua percepção é distinta. Além disso, ele se expressa de forma diversa, pois a sua expressão emocional também não se dá pela aprendizagem social.
A percepção distinta do autista, por exemplo, pode estar associada a uma hipersensibilidade sensorial. Assim, ruídos que não são perceptíveis para pessoas neurotípicas podem ser extremamente incômodos para o autista. Da mesma forma, estímulos visuais (cores e luzes), podem ser excessivos para o autista e gerar sensações desagradáveis. Cheiros que não deveriam causar nenhum incômodo, em geral, podem ser terrivelmente desagradáveis para o autista. Texturas e sensações táteis também podem causar incômodo e mesmo dor (areia da praia, toque, etiqueta da roupa, suor etc.).
Desse modo, ambientes que são habituais para pessoas típicas podem ser torturantes para o autista: o barulho do trânsito, as luzes e cores das lojas, a temperatura do ambiente, muitas pessoas falando ao mesmo tempo, cheiro de comida, cheiro de detergente e outros tantos estímulos que não nos incomodam, mas que torturam o autista.
Então, o primeiríssimo passo para começarmos a lidar com o choro compulsivo em público é buscar compreender o que esse choro cala, o que está incomodando o autista. Em geral, precisamos adivinhar. Para nós é muito difícil, porque não nos afetamos pelos mesmos estímulos que afetam o autista. Então, na nossa ignorância, pedimos que ele pare, se cale, que deixem de aborrecer, pois o levamos para passear e ele chora. Gritamos com ele, o castigamos e nos desesperamos, porque não sabemos como lidar com a situação de outra forma.
Mas ele está chorando e gritando porque está muito incomodado com algo. Não percebemos o incômodo e geramos novos incômodos. O que não ajuda, mas pode piorar a situação.
Cientes da nossa ignorância e impotência frente ao comportamento, precisamos supor que o comportamento é reflexo de um forte incômodo e que precisamos ajudar a reduzir o sofrimento retirando o estímulo que o incomoda, seja retirando a criança do local ou reduzindo o efeito do estímulo torturante. Além disso e acima de tudo, precisamos revelar empatia pelo sofrimento da criança, buscar compreendê-lo, tentar oferecer ajuda e evitar cobranças e castigos, pois o choro revela sofrimento e incômodo.
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