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Reforçadores – Parte II

No texto de hoje, vamos continuar falando de reforçadores, entretanto o foco será nos reforçadores alimentícios/comestíveis.

Sabemos que o comportamento alimentar começa a ser construído desde a primeira infância. Isso mesmo: os primeiros passos vêm já na introdução alimentar e a rotina e consumo dos alimentos vão, de forma gradual, determinar gostos, preferências para as idades futuras. Além disso, conceitos como fome e saciedade devem ser introduzidos aos pequenos desde essa fase.

Pacientes com TEA precisam de suas rotinas bem organizadas e definidas. Umas das principais características dos pacientes – o que, inclusive, é critério diagnóstico, segundo o DSM-V – são as dificuldades em trocas de rotinas. Esse ponto inclui a rotina alimentar dos pacientes, que também deve ser organizada e planejada. A partir disso, deve-se pensar em dois principais pontos sobre os reforçadores alimentares: quantidade e qualidade.

Quantidade: É preciso lembrar que a capacidade gástrica de uma criança não é a mesma de um adulto. As quantidades a serem oferecidas e ingeridas pelas crianças são menores. Pensando em uma rotina organizada e planejada, um paciente que possui reforçadores alimentares durante as terapias tem uma alteração na quantidade de alimentos consumidos e, consequentemente, na quantidade e/ou qualidade de alimentos que irão compor a próxima refeição. Adicionalmente, é preciso lembrar que o reforço está desviando aspectos importantes a serem definidos, como fome e saciedade, pois a criança não irá pensar se está com fome ou se precisa desse alimento neste momento – o fato de ele ser usado como reforçador inibe o paciente de pensar nesses aspectos e o foco dá-se apenas no reforçador.

Qualidade: Por questões biológicas e sensoriais, os alimentos mais utilizados para essa prática são alimentos ricos em açúcares e gordura. Dificilmente presenciamos, na prática clínica, um alimento com adequado valor nutritivo ser utilizado como reforçador. Aqui podemos lembrar da avaliação adequada para a introdução de reforçadores, de forma individualizada, a cada paciente. Por exemplo: se um paciente não tem, na rotina alimentar dele, uma ‘bolacha X’ – devido ao fato de esse alimento não possuir propriedades benéficas, ser um alimento com alto teor de açúcar, apesar de ser palatável –, esse alimento não deve ser incluído como reforço alimentar para o paciente, pois, dessa maneira, o reforçador estaria causando um efeito negativo a curto e longo prazo para o paciente que teve um alimento não nutritivo incluído na sua rotina e que muito possivelmente passará a fazer parte do seu dia a dia.

A prática de uso de alimentos como reforçadores é comum não apenas para terapeutas, mas também por pais, na rotina familiar. Estudos recentes indicam que essa prática deve levar em conta também a qualidade do alimento e não apenas a quantidade. Tudo dependerá da relação estabelecida e mantida ao longo do tempo entre esses estímulos e as respostas que os produzem.

 

Um estudo de 2015, publicado no jornal Eating Behaviors, discutiu o impacto negativo nos aspectos nutricionais que os reforçadores alimentícios podem ter quando usados de maneira generalizada ou não programada. Foram incluídos 207 pacientes entre 6-12 anos de idade. As utilizações indiscriminadas e não planejadas desses reforçadores podem trazer consequências nutricionais para os pacientes, como um inadequado estado nutricional ou padrão alimentar. Adicionalmente, o processo de aprendizado através do reforço está sendo diretamente ligado ao consumo de alimentos ricos em gordura/açúcares o que gera padrões alimentares inadequados, os quais podem percorrer as próximas fases de adolescência e até a vida adulta.

 

Nederkoorn, C., Smulders, F. T., Havermans, R. C., Roefs, A., and Jansen, A. (2006). Impulsivity in obese women. Appetite 47, 253–256.

Havermans, R. C., Giesen, J. C. A. H., Houben, K., & Jansen, A. (2011).Weight, gender,and snack appeal. Eating Behaviors, 12(2), 126–130. doi:10.1016/j.eatbeh.2011.01.010.

Lu J, Xiong S, Arora N, Dubé L. Using food as reinforcer to shape children’s non-food behavior: The adverse nutritional effect doubly moderated by reward sensitivity and gender. Eat Behav. 2015 Dec;19:94-7. doi: 10.1016/j.eatbeh.2015.07.003. Epub 2015 Jul 30. PubMed PMID: 26254032.

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