“ Seu filho tem autismo.”
Era dezembro de 2006, quando ouvimos esta frase pela primeira vez. Este diagnóstico mudaria para sempre, não apenas a vida de nosso filho caçula, então com 3 anos de idade, mas a vida de toda a nossa família.
Naquela época, senti como se as rédeas da minha vida escorressem pelos meus dedos como grãos de areia. O “amanhã” tornou-se um grande ponto de interrogação, ao mesmo tempo em que passamos a conviver com muitas incertezas.
Passei a temer o futuro de uma forma como jamais havia feito anteriormente.
18 de dezembro de 2018, em um salão de convenções de um hotel, acontece o evento de Formatura do Ensino Fundamental II de um Colégio.
Jovens com idade entre 14 e 15 anos, aproximadamente, são chamados um a um para subir ao palco e receber o “canudo” .
“João Pedro”, anuncia o professor, pedindo que suba ao palco o menino alto, de óculos, sorriso aberto e gel no cabelo de topete.
Ansioso, ele esfrega as mãos e, atendendo ao chamado, sobe ao palco .
É ele, nosso filho. O JP, de dezembro de 2006, a criança que havia sido diagnosticada com autismo e que não imaginávamos o quanto poderia evoluir.
Um longo filme passou pela minha cabeça em frações de segundos. Imagens, acontecimentos, momentos alegres e tristes permearam minha mente, enquanto eu assistia, com os olhos cheios d’água, JP vivendo aquele instante abençoado que ficará para sempre guardado em meu coração.
Mas a noite ainda nos reservava uma surpresa MUITO maior: JP faria parte do trio de oradores, pois havia sido escolhido pela turma para ser um dos alunos que iriam discursar.
O menino que em 2006 mal falava, fez um discurso; discurso este que escreveu sozinho, sem que ninguém o ajudasse.
Faltam-me palavras para descrever o que senti ao vê-lo lendo sua manifestação. Ao terminar, foi aplaudido de pé por uma plateia emocionada e carinhosa.
Foi a vitória da inclusão! E eu vivi para ver este dia chegar.
Esta bela vitória aconteceu porque a inclusão foi real, pois meu filho não apenas incluído, mas PRINCIPALMENTE acolhido, aceito, respeitado e querido pelo grupo.
Estudando no mesmo colégio desde os 3 anos de idade, JP tem alguns amigos que o acompanham desde então. A maioria do grupo o conhece desde meados do Ensino Fundamental I, há pelo menos 6 anos. Construíram com meu filho uma bela relação de amizade, respeito e carinho.
A inclusão é uma via de mão dupla e, ao contrário do que muitos pensam, ela é um processo que não beneficia apenas o incluído. Ganham todos: os que incluem, o incluído, o corpo docente e todos aqueles que fazem parte do processo, direta ou indiretamente, pela inclusão escolar. Conviver com o diferente, com as diferenças, promove a tolerância, incentiva o respeito e o amor ao próximo, além de colaborar para a construção de uma sociedade mais justa e inclusiva para todos os cidadãos.
Contudo, reconheço que nossa história é um verdadeiro “oásis no deserto” pois, infelizmente, os episódios bem-sucedidos de inclusão não são frequentes, correspondendo a uma parcela ainda minoritária dos casos.
Entretanto, nossa trajetória não foi constituída apenas por momentos felizes. As intempéries foram inúmeras e o caminho tortuoso.
Mas foi ele que, destemido, nos ensinou a não temer o amanhã e nos mostrou como ficar de pé, mesmo quando o mar, o vento ou a chuva insistem em querer nos derrubar. Ele nos ensina a ser pessoas melhores todas os dias e segue em frente mostrando que o impossível não existe!
Sua persistência foi um fator determinante em sua conquista, sem dúvida!
Venceu todas as dificuldades que a vida lhe trouxe, ultrapassou as barreiras do preconceito e não permitiu que um diagnóstico limitasse seus sonhos e seus desejos, e determinasse quem ele é.
Na hora da foto oficial da turma, haviam jovens felizes, com sorrisos largos e um mundo totalmente novo a se descortinar para todos eles. E nosso filho era um deste jovens.
Abriu os braços na hora da foto, comemorando com alegria o momento, assim como os demais.
Pela primeira vez, em muitos anos, em meu coração eu não tive medo do futuro.
Senti apenas esperança e muita fé de que uma nova geração está nascendo para construir uma sociedade melhor para todos, sem exceção.
Denise Aragão
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