Se você, leitora/o, se indignou ou se assustou com o título deste post, peço que tenha paciência de ler este texto até o final para que possa compreender o porquê deste título.
Entretanto, antes de seguirmos adiante, cabe esclarecer que:
Bater = pulsar de felicidade
Apanhar = sofrer de tristeza
Isto posto, convido você para um mergulho nas águas profundas e ora nebulosas, ora azuis, do autismo.
Um relato enviado no último final de semana por uma mãe cujo filho foi diagnosticado recentemente, trouxe a seguinte dúvida:
“Há dois meses acompanho seu blog; porém, uma dúvida me atormenta:
Mãe de autista é sempre mais triste do que feliz?
Pois sinto uma dor dentro do peito que não cessa nunca.
Será que estarei “condenada” a uma vida de tristeza eterna?”
Antes de “tentar” responder a esta pergunta, cabem aqui algumas ponderações. Existe um senso comum a respeito de quase tudo nesta vida. O assunto autismo, infelizmente, não escapa desta regra.
Fato é que grande maioria das pessoas acredita que mães de autistas são pessoas especiais, fortes e destemidas que enfrentam as dificuldades com resignação, pois sabem exatamente o que fazer e quando fazer.
Se você faz parte deste grupo que acredita nesta teoria, sinto muito em lhe frustrar;
a grande verdade é que nós, mães de pessoas com autismo, não somos “mais especiais” do que quem quer que seja e, muito menos, somos a “fortaleza” ou o “poço” de segurança que muitos pensam.
No outro extremo da situação, existe também uma ideia (“comprada” por muitos!) de que mães de autistas, ou mães de pessoas com deficiência em geral, são mulheres marcadas pela dor e tristeza infinitas. Pessoas destinadas a viver toda uma existência, exclusivamente, sofrendo, sem a menor possibilidade de ser felizes. Então, se você pensa desta forma, lamento, mas suas convicções estão igualmente equivocadas, assim como as do outro grupo.
Segundo Aristóteles: “A verdade está no caminho do meio”. Isto é, a melhor medida é sempre a do meio. Ou seja, nem tanto ao céu, nem tanto à terra. Mães de autistas não são sempre felizes, nem sempre tristes.
Coração de mãe de autista “bate”, forte e acelerado, com toda e qualquer vitória de seu filho, ainda que aos olhos de qualquer pessoa esta conquista pareça insignificante. Coração de mãe de autista “apanha” quando seu filho é alvo de preconceito, bullying, discriminação e etc.
Coração de mãe de autista “bate”, freneticamente descompassado, quando seu filho/a abre o maior e mais belo sorriso do mundo e lhe olha de forma apaixonadamente desconcertante e irresistível. Coração de mãe de autista “apanha” quando lembra que não é imortal.
Coração de mãe de autista “bate” quando vê seu filho verdadeiramente incluído, tendo seus direitos respeitados. Coração de mãe de autista “apanha” quando pensa no futuro.
E assim por diante…
Poderia listar uma série de fatos e situações que nos tornam felizes e outras tantas que nos deixam tristes.
A felicidade é efêmera, passageira e inconstante e isto não é uma exclusividade de mãe de autista; isto acontece com todo e qualquer ser humano. Ora estamos felizes, ora nem tanto.
É natural que na fase pós diagnóstico, a dor seja muito mais pungente e aguda, massacrando nossa alma e nosso coração. Não à toa, a fase pós diagnóstico é denominada de luto. Portanto, é por este motivo que neste momento a dor parece nunca cessar dentro do peito.
Entretanto, o luto, um dia, chega ao fim. E para que isto aconteça, é inegável que precisa ser vivido, sentido, sofrido, em todas as nuances. Só é possível superarmos o luto se o vivermos intensamente.
Deste forma, podemos “virar” a página.
Quanto tempo este luto pode durar?
Esta, infelizmente, é mais uma pergunta sem resposta padrão, como tudo o mais que se refere ao autismo. Pode durar dias, semanas, meses ou até mesmo anos, variando de indivíduo para indivíduo.
O mais importante é que seja superado o mais breve que puder, para que possa reagir e ajudar o seu filho. A dor que agora parece intransponível e incessante, vai ceder. A ferida que está aberta, em breve, iniciará o processo de cicatrização.
E então, você perceberá que, lentamente, seu corpo, sua mente, sua alma e seu coração começarão a reagir. O tom cinzento que atualmente é presença constante em seus dias dará lugar a cores vibrantes e mais coloridas – o que não significa, absolutamente, que os “dias chuvosos” não mais acontecerão!
Dias alegres e dias tristes se alternarão, como em uma montanha-russa. Experimentamos momentos felizes quando a montanha-russa sobe e sofremos quando ela desce. Ninguém, absolutamente ninguém é sempre triste ou sempre feliz. Até porque para que a felicidade aconteça, infelizmente, a tristeza se faz imprescindível.
Denise Aragão
2025 © Instituto Priorit - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por UM Agência