Nunca foi segredo que o maior de todos os meus receios atende pelo nome de futuro.
Embora me esforce, diariamente, para conter este medo, confesso que nem sempre consigo evitar que o temor se instale dentro de mim, disseminando incertezas e desespero.
Inúmeras vezes minha ansiedade me leva a hipotéticos cenários futuros (nada animadores!) que me fazem perder o sono…
Todas as noites, em minhas orações, rogo a Deus para que dissipe este temor, fazendo-o desaparecer de meus pensamentos. Há cerca de um mês e meio, a resposta para minhas preces surgiu; surpreendentemente, esperava por mim na fila de um supermercado lotado.
Na fila, fazia a leitura de meus emails e mensagens enquanto aguardava a minha vez. Contudo, uma voz masculina, com uma prosódia diferente, me despertou a atenção: “Mamãe, posso colocar o pote de margarina juntamente com os produtos congelados?”
O rapaz à minha frente, de quase 1,90m de altura, era quem fazia a pergunta. Ao seu lado estava sua mãe, uma senhora de aproximadamente 65 anos, que colocava os produtos na esteira do caixa. Automaticamente, meu instinto de mãe de autista me levou a prestar atenção naquele rapaz. A mãe do rapaz respondeu, com doçura, a pergunta do jovem: “Claro, meu querido!”
Tomada pela admiração, observei o rapaz arrumar de forma metódica e extremamente organizada as compras. Não obstante, percebi seu carinho e cuidado com sua mãe. Quando algumas moedas caíram da carteira da mãe e ela fez menção de se abaixar para pegar, ela a interrompeu gentilmente, dizendo que ela não poderia se abaixar abruptamente em razão da artrose na coluna.
A caixa, que também havia notado o gesto do rapaz, comentou que ele era um filho de ouro. Neste momento, feliz por ter sido elogiado, ele começou a agitar as mãos freneticamente, um movimento que nós, mães de autistas, conhecemos muito bem. De repente, sem que sequer tenha me dado conta, as lágrimas começaram a rolar pelo meu rosto, e não consegui contê-las.
Neste momento, todos me olharam: a caixa, a senhora, o rapaz e o restante da fila. A sensação que tive era que TODOS no supermercado perceberam que eu estava chorando. Constrangida, apressei-me em colocar minhas compras na esteira.
Foi quando a senhora se aproximou e me olhou nos olhos: seu olhar era doce, plácido e repleto de uma paz convidativa e reconfortante. Esta paz me motivou a chorar sem vergonha ou temor. Num impulso, ela me abraçou. Não apenas me permiti ser abraçada como também devolvi o gesto com carinho e ternura.
Começamos a conversar. Contei a ela que tenho um filho autista, de 13 anos de idade. Ela me confirmou que seu filho, de 34 anos, também tinha autismo e trabalhava em uma drogaria como estoquista. Enfrentaram inúmeras dificuldades durante toda a vida; o diagnóstico, por exemplo, veio apenas aos 11 anos de idade.
O marido, pai do rapaz, não aguentou a barra e foi embora dois anos após a confirmação do diagnóstico. Sozinha, lutou todos os dias contra tudo e contra todos. Percebendo minha fragilidade, me contou que não houve um único dia em que ela não tivesse temido o amanhã. Assim como eu, ela também teve muito, muito medo do futuro.
Entretanto, me revelou que praticamente quase todos os seus medos foram infundados. O futuro sombrio e cinzento que ela imaginava nunca se concretizou, felizmente – o que não significava, absolutamente, que eles vivessem em um “mar de rosas”.
Conversamos muito e sobre tantas questões! Ansiosa, fiz uma avalanche de perguntas, às quais ela respondeu tranquilamente. Trocamos telefones e contatos. Antes de nos despedirmos, minha mais nova amiga me brindou com um valiosíssimo conselho:
“Querida, não se angustie tanto com o que ainda está por vir. Sofri demais por situações que jamais chegaram a acontecer, mas que eu havia criado em minha mente e que atormentaram por anos. Quando olho para trás, lamento apenas ter perdido noites e derramado tantas lágrimas por fantasmas que eu mesma criei. Pois a grande verdade, meu bem, é que nenhum de nós sabe o que nos espera. E isto acontece com todos, independente do autismo ou de qualquer outra questão.
Viva cada dia intensamente. Se hoje tiver problemas, enfrente-os, da melhor forma que lhe for possível. Se hoje o dia for repleto de vitórias, “saboreie” cada uma delas, aproveitando para renovar suas forças e energia. Não sabemos o que o futuro nos reserva; e angustiar-se por isso é a melhor forma de desperdiçarmos o presente.”
E justamente com esta belíssima lição de vida e sabedoria, desejo a todos vocês um ANO NOVO FELIZ! Que um novíssimo ciclo se inicie em nossas vidas! E que saibamos vivê-lo, aproveitando cada momento!
Denise Aragão
2025 © Instituto Priorit - Todos os direitos reservados.
Desenvolvido por UM Agência