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UMA HISTÓRIA REAL DE NATAL

A vida é um sopro. Apesar de termos consciência desse fato, por vezes tenho a impressão de que nos esquecemos dessa inexorável realidade.

E acabamos por viver ignorando, talvez, a maior certeza que temos: a sua brevidade.

O final do mês de novembro nos reservou tristes surpresas: em menos de uma semana, a perda de dois familiares recordou-me sobre a finitude de nossa existência.

E precisamos seguir em frente, pois a vida não para…

Com a proximidade das festas de final de ano, temos novamente shoppings centers lotados, ruas com trânsito caótico e supermercados igualmente cheios.

Não consegui fugir à regra e fui ao mercado comprar alguns itens de última hora que faltavam para as ceias de final de ano. Apesar de ter sido bastante rápida ao escolher os produtos, não tive como escapar da fila homérica e que andava vagarosamente.

Assim sendo, tendo pela frente pelo menos uma hora de espera, restou-me apenas refletir em tudo o que havia acontecido nos últimos tempos. A tristeza rapidamente abateu meu coração e semblante. Estava tão introspectiva e envolvida em meus pensamentos que demorei a perceber que a moça que estava atrás de mim me fazia uma pergunta.

“Este estojo é seu, moça?” – perguntou ela, segurando em suas mãos um pequenino estojo, onde carrego diversos lápis e canetas.

“Sim! Deve ter caído quando eu abri a bolsa para atender o celular. Muito obrigada!”, respondi, pensando no quanto eu estava distraída.

A jovem se apresentou: chamava-se Clara (nome fictício) e tinha 33 anos. Casada, mãe de dois filhos, enfermeira.

Rapidamente, começamos a conversar e, em menos de meia hora, tive a sensação de conhecer Clara desde a infância. Ao contar para ela que eu também tinha dois filhos e que o caçula tinha TEA, Clara se surpreendeu e disse que seu filho mais velho também havia sido diagnosticado no espectro autista. Conversamos sobre autismo, maternidade e as diversas questões relacionadas ao assunto.

Entretanto, em um dado momento, ela comentou que notou o quanto eu estava distraída na fila. Contei sobre as perdas de nossa família e o que havia acontecido. Repentinamente, ela me abraçou! Foi tão inesperado e, ao mesmo tempo, tão reconfortante que, sem que eu percebesse, lágrimas desceram pela minha face.

Clara então me relatou que precisava lidar com a finitude todos os dias. E, ao contrário do que eu poderia imaginar, fui surpreendida com um relato de fé e esperança na vida.

Ao ser confrontada diariamente com a realidade, Clara poderia ter adotado uma visão pessimista do futuro e do que espera a todos nós, mas, com sabedoria, soube enxergar aquilo que alguns de nós não conseguem fazer: “a vida é muito curta para ser pequena” (conforme Benjamin Disraeli).

Então, transfira esse aprendizado para o seu dia a dia, seja valorizando cada segundo ao lado das pessoas que ama, seja vivendo cada dia como se fosse um dia especial, seja comemorando cada conquista de seu filho com TEA, agradecendo a Deus por cada dia de vida ou simplesmente olhando o pôr do sol ao cair da tarde.

A fila andou sem que nós percebêssemos. A conversa, de tão prazerosa, poderia durar ainda muito mais tempo.

Nos despedimos, trocamos telefones e, em meu aniversário, na semana passada, Clara enviou-me uma mensagem desejando felicidades e “Feliz novo ano!”.

Muito obrigada, Clara. Tê-la conhecido e conhecido a sua história foi enriquecedor e um grande presente que pude receber nesse ano que termina.

O sofrimento pode e deve nos trazer ensinamentos, pois, afinal de contas, “a ferida é o lugar por onde a luz entra em você” (Poeta Rumi).

Que, em 2020, nossos corações e almas estejam repletos de amor, fé e que os dias melhores, que tanto almejamos para nossos filhos e todas as pessoas com deficiência de nosso país, se tornem finalmente realidade.

Feliz Natal! Feliz 2020 para todos nós!

Denise Aragão.

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